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Vieira da Silva: Uma explosão de cor

Maria Helena Vieira da Silva, uma das mais importantes pintoras europeias da segunda metade do século XX, nasceu em Lisboa em 13 de Junho de 1908.

Filha do embaixador Marcos Vieira da Silva, ficou órfã de pai aos três anos, tendo sido educada pela mãe em casa do avô materno, director do jornal O Século.


Tendo mostrado interesse, desde muito pequena, pela pintura e pela música, começou a estudar pintura, a partir de 1919, com Emília Santos Braga e Armando Lucena.

Em 1924, frequenta as aulas de Anatomia Artística da Escola de Belas Artes de Lisboa, pensando em se tornar escultora.

Em 1928 vai viver em Paris, acompanhada pela Mãe, e também visita Itália. No regresso a Paris começa a frequentar as aulas de escultura de Bourdelle, na Academia La Grande Chaumièremas abandona definitivamente a escultura, depois de frequentar as aulas de Despiau.

Começa então a estudar pintura com Dufresne, Waroquier e Friez, participando numa exposição no Salon de Paris. Conhece então, o pintor húngaro Arpad Szenes, com quem se casa em 1930, e com ele visitará a Hungria e a Transilvânia.


Durante a década de 30, integra a geração da Nova Escola de Paris e segue os ensinamentos de Fernand Léger, Henri Waroquier e Charles Dufreuse, mantendo, contudo, alguma independência dos -ismos de uma Europa efervescente. Cezanne, Picasso, Duchamp, Braque, Dubuffet, Paul Klee, Mondrian são só alguns dos nomes que a marcaram.

Estava lançado o destino de M. Helena na sua ligação ao abstracionismo propondo obras onde era clara a fragmentação de motivos figurativos num processo destrutivo das formas significantes em demanda do onírico. Mantém uma arte que, privilegiando formas e cores, nega temas e figuras e bane o compromisso com a realidade.


Quedando-se, inicialmente, num abstracionismo geométrico, denominado em Françal’Art Concret, caminha a bom ritmo para a Abstração Lírica deslizando para o Expressionismo Abstracto onde formas e cores são privilegiadas em detrimento dos valores gestualistas.

Tudo isto, diga-se, sem nunca perder uma marca que a personificava, independente, autónoma, caracterizada pela sua cultura visual. Tinha consciência, M. Helena, de que “a obra de arte reflecte-se na superfície da consciência […] [e que] a análise dos seus elementos constitui uma ponte em direcção à vida interior da obra” (Kandinsky). O seu percurso culmina na abstração a partir da figuração.


Em 1935 António Pedro organiza a primeira exposição da pintora em Portugal, e que a faz estar em Portugal por um breve período, até Outubro de 1936, após o qual voltará a Paris, onde participará activamente  na associação «Amis du Monde», criada por vários artistas parisienses devido ao desenvolvimento da extrema direita na Europa.

Regressará a Portugal em 1939, devido à guerra, já que para o seu marido, judeu húngaro, a proximidade dos nazis o incomodava, naturalmente. Ficará em Portugal por pouco tempo, pois o governo de Salazar não lhe restitui a cidadania portuguesa,mesmo tendo casado pela igreja. 

Não deixa de participar num concurso de montras, realizado no âmbito da Exposição do Mundo Português, que também lhe encomendou um quadro, mas cuja encomenda será retirada.


O casal de pintores decide a ir para o Brasil, até porque as notícias sobre uma possível invasão de Portugal pelo exército alemão não são de molde a os sossegar.

Em Brasil serão recebidos de braços abertos, recebendo passaportes diplomáticos, que substituem os de apátridas emitidos pela Sociedade das Nações, tendo mesmo recebido uma proposta de naturalização do governo.

Conhecem os poetas Murilo Mendes (1901-1975) e Cecília Meireles (1901-1964) e o pintor Carlos Scliar (1920-2001). No mesmo ano, Vieira e Arpad fazem, para a Escola Nacional de Agronomia, painéis de azulejos e retratos de cientistas, nomeando esse conjunto de Quilômetro 44, referência ao endereço da Escola.

Em 1947, Maria Helena retorna a Paris, onde realiza muitas exposições. Em 1949, Pierre Descargues publica a primeira monografia sobre a artista e, em 1954, o crítico Guy Weelen passa a organizar e divulgar a sua obra e a de seu marido, tendo escrito uma série de estudos e organizado diversas exposições. Em 1956, foi-lhe dada a naturalidade francesa.

É a época em que Vieira da Silva começa a ser reconhecida. O estado francês compra-lhe La Partie d'échecs, um dos seus quadros mais famosos. Vende obras suas para vários museus, realiza tapeçarias e vitrais, trabalha em gravura, faz ilustrações para livros, cenários para peças de teatro.


Em Portugal, a artista também foi reconhecida, especialmente após a Revolução dos Cravos, tendo realizado várias obras encomendadas para o Estado português, tais como os painéis decorativos das estações metropolitanas da Cidade Universitária e do Rato ou os dois cartazes publicados pela Fundação Calouste Gulbenkian, a pedido da poetisa e amiga Sophia de Mello Breyner, para comemorar a data da revolução.

Em 9 de Dezembro de 1977, foi galardoada com a Grande Cruz da Ordem Militar de Sant'Iago da Espada e em 16 de Julho de 1988, com a Grande Cruz da Ordem da Liberdade, para além das Medalhas da Cidade de Lisboa e do Porto pelas respectivas Câmaras Municipais. Para além destas distinções atribuídas pelo Estado Português, várias associações e instituições portuguesas já tinham honrado a vida e obra da artista, tais como o Prémio Literário de Lisboa e a Academia de Belas Artes de Lisboa, que a tornaram membro honorário em 1968 e 1971, respectivamente, e foi também eleita em 1984 para a Academia das Ciências, Artes e Letras de Lisboa.


Fontes:

José Augusto França, “A Arte em Portugal no Século XX”, Lisboa, Bertrand, 1974.

Enciclopedia Itaú Cultural

Silva, Vieira da; Aguilar, Nelson (2007).Vieira da Silva no Brasil. Museu de Arte Moderna de São Paulo

Ulisseyas Enciclopedia

04/05/21 - Museu Arpad Szenes - Vieira da Silva - Lisboa

19/05/2021- 

Coleção Berardo - Centro Cultural de Belém



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