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Caspar Friedrich e o romantismo alemão


Caspar David Friedrich, 1774-1840

Em 1817 o poeta sueco Per Daniel Atterbon visitou o pintor alemão Caspar David Friedrich, em Dresden. Passados trinta anos, escreveu as suas impressões sobre o artista. “Com uma lentidão meticulosa, aquela estranha figura colocava as suas pinceladas uma a uma sobre a tela, como se fosse um místico com seu pincel”.

                                        O viajante sobre o mar de névoa, 1818.

As figuras místicas e os génios brilhantes foram os heróis do Romantismo. Jovens com expressões de entusiasmo ou com os olhos sonhadores, artistas que morriam ainda jovens na consciência melancólica do seu isolamento social povoavam as galerias de retratos por volta de 1800.

                                                A Cruz na montanha, 1807.

Friedrich afirmava frequentemente que um pintor que não tivesse um mundo interior não deveria pintar. Do mundo exterior vê-se apenas um pequeno extrato, todo o resto é fruto da imaginação do artista, que não necessita de permanentes estímulos externos. 

                                        Abadia no Carvalhal, 1810.

Tal como a Natureza se tornou um conceito-chave na filosofia do Romantismo alemão, também a paisagem assume um papel central na obra de Friedrich, embora se possam encontrar várias figuras humanas no seu trabalho, ele parece ter interrompido a produção de retratos após 1810. 

            A colina e o campo lavrado em Dreden, 1814.

No entanto, o principal tipo de paisagem pela qual Friedrich se interessava nunca foi a simples imitação da natureza, mas antes o resultado de uma complexa interação entre impressão visual e reflexão mental e emocional.

                As fases da vida, 1835.

As imagens de Friedrich são invariavelmente marcadas por estruturas rigorosas, simetrias precisas construções geométricas e contrastes entre o vertical e o horizontal. Nas palavras de Friedrich, uma imagem deve ser seelenvoll – “plena de alma” – no efeito que produz, para que possa ser considerada uma obra de arte.

                        A cruz e a catedral na montanha, 1832

“Uma composição baseada principalmente na vida ou construída de acordo com as regras académicas poderá ser um bom exemplo, mas não conseguirá causar qualquer impacto junto ao espectador”. A maioria dos artistas contemporâneos de Friedrich via nas suas paisagens ideias construídas infiéis à natureza.

                    O nascer da lua sobre o mar, 1822

Os temas sobre o mar, portos e navios desempenham um papel destacado na obra de Friedrich. Esses motivos parecem tê-lo tocado profundamente. Esse facto levou muitos escritores a insistirem em diferentes interpretações psicológicas e religiosas, muitas vezes sem refletirem.

                Mulher diante da autora, 1818

No contexto das paisagens românticas, da emoção, do alcançar romântico da esfera universal e da associação, comum na Alemanha daquele tempo, entre os objetivos utópicos e religiosos, as suas imagens possuem uma dimensão de profundidade fascinante.

                Manhã sobre a montanha, 1810

Por volta de 1810, Friedrich terminou as suas primeiras obras-primas, que lhe trouxeram uma forte aclamação pública. No entanto, de acordo com alguns contemporâneos, por esta altura já tinha tentado o suicídio por uma vez.

                                                Navegando, 1818-1819.

Recordemos um pouco de sua vida pessoal. Caspar David Friedrich nasceu a 5 de setembro de 1774, em Greifswald. Os amigos espalharam o rumor de que sua família descendia, por parte de seu pai, de uma linhagem de condes já muito antiga, expulsos da Silésia por serem protestantes, tendo-se dedicado ao negócio do fabrico de sabão na Pomerânia; outros falavam na dinastia de condes suecos. Não existe qualquer fundamento documentado da gênese aristocrática ou das origens suecas – embora a admiração de Friedrich pela Suécia seja inegável.

                                O mar de gelo, 1823.

O pai era um luterano severo que transmitia aos filhos seus princípios morais excessivamente rígidos. Com a morte da mãe em 1781, as crianças foram criadas por uma amorosa governanta. 

                    O Watzmann, 1824.

Friedrich foi à Universidade, aprendeu Desenho de Arquitectura o que ajudou a despertar o seu amor pela natureza e pela paisagem. O mestre de desenho na Universidade, Quistorp, proporcionou a Friedrich uma sólida formação. Com Tomas Thorild, professor de Literatura e Estética, aprendeu a distinguir o olhar espiritual (superior) do olhar físico (exterior), o que viria a ser vital em sua obra.

                Túmulo sobre a neve, 1807

Em 1805 Friedrich desfruta, pela primeira vez, de grande sucesso. Recebe o primeiro premio por dois desenhos, em sépia, em um concurso organizado por Johann Wolfgang von Goethe, em Weimar, atraindo então a atenção e o aplauso de toda a crítica, com diversos outros trabalhos.

            O monge à Beira Mar, 1808-1810

Em 1810 “O Monge à beira-mar” e “A Abadia no Carvalhal” marcam o inicio dos que viriam ser, provavelmente, os anos de maior sucesso de sua carreira.

                                Os penhascos de Rugen, 1818.

Já como membro da Academia de Artes de Dresda e com segurança financeira, casa-se em 1818 com Caroline Bommer, com quem teve 3 filhos. É quando produz “O viajante sobre o mar de névoa”, provavelmente sua mais conhecida obra.

                                    O caçador na floresta, 1814

Por razões políticas (odiava Napoleão) viu fecharem-se contra si muitas portas a partir de 1819.  

Em 1835 Friedrich sofre uma apoplexia que o deixa parcialmente paralisado dos braços e pernas. A venda de quadros ao czar da Rússia financia um mês de convalescença em Teplice. Acaba por falecer em 7 de maio de 1840. Está enterrado em Dresden.

                Paisagem de inverno com igreja, 1811

Uma exposição em Berlim, em 1906, apresentando quadros e esculturas do período 1775-1875, apresentou 32 trabalhos de Friedrich. Esta ocorrência marcou a redescoberta do pintor, que se prolonga até à atualidade.


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