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Santa Rita Pintor, o primeiro futurista português.

 

Formado pela Academia Real de Belas-Artes, parte para Paris como bolseiro do Estado em Abril de 1910. Monárquico convicto, perde a bolsa dois anos mais tarde devido a um conflito com o embaixador republicano, João Chagas. Em Paris priva com Mário de Sá-Carneiro (que se inspirará nele para um personagem de A confissão de Lúcio, 1914); contacta com círculos artísticos de vanguarda, nomeadamente com Marinetti, assistindo às suas conferências na Galerie Berheim-Jeune. O impacto de Marinetti e do seu manifesto futurista é reforçado, em 1912, pela visita à exposição dos pintores futuristas italianos nessa mesma galeria, levando-o a aderir ao movimento. Nesse mesmo ano terá exposto, no Salon de Indépendents parisiense, o quadro O Ruído num Quarto sem Móveis, cujo título, por si só, "dava o mote futurista dos seus interesses".

De personalidade paradoxal, Santa-Rita era, segundo Sá-Carneiro, "um tipo fantástico", "ultramonárquico","intolerável", "insuportavelmente vaidoso". Regressa a Portugal em 1914, ano de eclosão da 1ª Guerra Mundial. Sensível à glorificação da máquina de Marinetti, à sua apologia de uma arte totalmente nova e diferente, em rutura com o passado retrógrado, à sua agressividade e desejo de chocar as mentes conservadoras, Santa-Rita será, a par de Mário de Sá-Carneiro, um dos principais introdutores das ideias futuristas em Portugal, tornando-se no dinamizador do embrionário movimento futurista português. Em 1916 afirmaria: "Futurista declarado em Portugal há um, que sou eu.

São muito poucas as obras que sobreviveram à ordem de destruição cumprida pela família de Santa-Rita após a sua morte. Alguns raros exercícios académicos, realizados por certo enquanto aluno de Belas Artes, e duas pinturas de maior relevo e de datação incerta: Orfeu nos Infernos, c. 1907 (?) e Cabeça c.1910.


Reproduzida em 1917 na revista Portugal Futurista, Orfeu nos Infernos é uma obra de grande violência expressiva e, embora José Augusto França a (des)considere como uma "espécie de «canular» de escolar de Belas Artes", a pintura tem características temáticas e formais invulgares que a distinguem das práticas artísticas do seu tempo de estudante de Belas Artes, dominadas por convenções oitocentistas. A sua data de execução é provavelmente posterior à indicada em Portugal Futurista (segundo essa legenda, a obra teria sido pintada quando Santa-Rita tinha 14 anos de idade); Joaquim Matos Chaves sugere uma data entre 1913 e 1915. "Obra fantástica e delirada, em agitações cromáticas de acre domínio avermelhado", nelas Santa-Rita evoca a figura de Veloso Salgado, seu mestre, como personagem do inferno.



Cabeça, (MNAC, Lisboa), pelo seu lado, é consensualmente considerada uma obra central do modernismo em Portugal. Datada no verso por mão desconhecida, o ano de execução permanece incerto, mas deverá localizar-se entre 1910 e 1912, precedendo portanto as pinturas cubistas de Amadeo ou de qualquer outro autor português. Esta obra aproxima-se das máscaras africanas evocadas por Picasso nas Demoiselles d’Avignon, ou de outras obras do mesmo autor datadas de 1909 e 1910, mas a sua dinâmica compositiva, dominada por formas curvas e por um forte sentido de movimento, não será alheia às explorações dos futuristas, nomeadamente de Umberto Boccioni.

Santa-Rita Pintor foi, segundo os especialistas, o mais activo impulsionador do breve movimento futurista português, mas morreu antes mesmo de completar 29 anos de idade, vitimado por tuberculose pulmonar. O artista quis que a obra morresse com ele e pediu à familia para queimar tudo após a sua morte.




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